segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Theotonio dos Santos na China - parte I

Num momento onde a China torna-se centro das atenções aos que procuram compreender as transformações contemporâneas, disponibilizaremos ao longo dos próximos dias alguns textos que remetem à relação de Theotonio dos Santos e sua obra coma China: um texto dele, outros de autores chineses sobre sua obra e uma entrevista dada ao Beijing News.

Começaremos com o artigo "As Obras de Theotônio dos Santos na China" de Shu Chang-sheng. Este é Professor doutor do IFCS/UFRJ. O autor foi orientado pelo professor Theotonio dos Santos no seu mestrado em Economia da Universidade Federal Fluminense, de 1995 a 1998, durante o período, trabalhou para o Grupo de Estudos sobre a Economia Mundial, a Integração Regional e o Mercado de Trabalho (GREMIMT), coordenado por Theotonio.

As Obras de Theotônio dos Santos na China

Shu Chang-sheng1

Em 2001, o Instituto de Estudos Latino-americanos da Academia Chinesa das Ciências Sociais colocou como uma das suas atividades principais do ano, a tradução do livro Los Retos de la Globalización, Ensayos en Homenaje a Theotônio dos Santos.2 A Social Sciences Documentation Publishing House, editora afiliada à Academia das Ciências Sociais (de cujo Conselho Editorial participa Theotônio dos Santos), publicou a versão chinesa desse livro de 2 volumes, com um novo título Globalização e Sistema Mundial, Ensaios em Comemoração dos 60 Anos de Theotonio dos Santos.3

Na sua “Apresentação da Tradução”, o coordenador da tradução Bai Fengsen disse: “Theotônio dos Santos é economista e sociólogo da República Federativa do Brasil. Ele tem estudado, ao longo da sua carreira, os problemas do desenvolvimento sócio-econômico dos países subdesenvolvidos, sempre buscando desvendar as leis do desenvolvimento capitalista. Junto com os outros pesquisadores, Theotônio formulou a “teoria da dependência”, um pensamento muito importante na América Latina...”

Há muito tempo Theotônio dos Santos tem colaborado com a UNESCO, que na comemoração do seu 60 anos de aniversário, organizou um livro de artigos de vários autores para discutir os problemas da globalização, em homenagem a Theotônio dos Santos.”4

No livro Globalização e Sistema Mundial, Ensaios em Comemoração dos 60 Anos de Theotônio dos Santos, foi acrescentadado um apêndice, no qual foram publicadas versões chinesas das duas obras mais recentes de Theotônio, uma é A Teoria da Dependência: Balanço e Perspectivas,5 e a outra, Economia Mundial: Integração Regional & Desenvolvimento Sustentável.6 A publicação dessas duas obras de Theotônio é uma continuação da publicação da sua obra-prima Imperialismo y Dependência em 1992 (primeira edição) e 1999 (segunda edição), pela mesma editora— Social Sciences Documentation Publishing House.7

Na introdução da edição chinesa de Imperialismo y Dependência, Yuan Ying-cang, pesquisador do Instituto de Estudos Latino-americanos da Academia Chinesa das Ciências Sociais afirmou:

Imperialismo y Dependência de Theotônio dos Santos é uma das obras principais da Teoria da Dependência. Formulou, de maneira sistemática e convincente, o conceito, as formas e as estruturas da Dependência... A Teoria da Dependência surgiu na América Latina no início dos anos 60 até o meado dos anos 70, como um instrumento para estudar a expansão do imperialismo nos países subdesenvolvidos. A característica principal desse pensamento social é abordar a questão do imperialismo através das perspectivas dos países periféricos do sistema capitalista contemporâneo.

Theotônio abordou a problemática do ponto de vista marxista-leninista. A sua motivação é aprofundar e enriquecer a Teoria do Imperialismo concebida por Lenin. A partir das suas analises sobre a expansão das corporações transnacionais e das novas formas da Dependência, Theotônio fortaleceu a metodologia do marxismo e a capacidade deste de explicar as novas realidades históricas...”8

Theotônio dos Santos é reconhecido na China como um dos principais fundadores da Teoria da Dependência. Nasceu em Carangola, Minas Gerais, em 11 de novembro de 1936. Entre 1958 e 1961 se formou em sociologia na Faculdade de Economia da Universidade Federal de Minas Gerais. Entre 1960 e 1964, estudou sistematicamente o marxismo. Uma parte importante de sua atividade intelectual nesse período foi sua participação nos movimentos sociais que se estendeu à clandestinidade depois do golpe de 1964 até 1966 quando se exilou no Chile. O eixo da sua militancia política era a POLOP, de que foi fundador em 1961 e cuja direção nacional assumiu em 1964. Depois do golpe militar, foi expulso da Universidade de Brasília e condenado à prisão pelo tribunal Militar de Belo Horizonte, como “autor intelectual da penetração subversiva no campo”. Theotônio exilou-se no Chile em 1966, momento em que se vinculou à Universidade do Chile como investigador e posteriormente diretor do Centro de Estudos Sócio-Econômicos (CESO).

No Chile, ele continuou a sua investigação científica. Assinalou que, desde século XVI, com a expansão internacional do capitalismo comercial e financeiro, se formaram as bases de uma economia mundial monopolista e excludente. Desta economia mundial, Theotônio focalizou na questão da Dependência— os países dependentes, que são parte integral indispensável da reprodução dessa economia mundial, mas se expandem apenas como reflexo da expansão dos países centrais. No que se refere às formas históricas da Dependência, Theotônio destacou a Dependência Colonial, baseada na hegemonia do capital comercial financeiro; a Dependência Financeiro-Industrial, baseado no domínio das grandes indústrias dos países centrais que investem nas periferias para produzir as matérias primas e os produtos agrícolas que seriam consumidos nos centros hegemônicos e finalmente, a Dependência Tecnológico-Industrial, baseada no domínio das empresas transnacionais sobre os países dependentes, produzindo para o mercado interno da periferia. Essa é a Nova Dependência, caracterizada pela super-exploração do trabalho e pela concentração do grande capital industrial.

A publicação do livro Globalização e Sistema Mundial, Ensaios em Comemoração dos 60 Anos de Theotonio dos Santos demonstra a preocupação dos chineses com o tema da globalização. Depois da crise financeira asiática em 1997, principalmente na véspera da entrada da China na OMC, a questão da globalização tem-se tornado um foco para o meio acadêmico da China. Os grandes capitais estão operando no país, trazendo o risco da Dependência para a China. Portanto, as obras de Theotônio dos Santos servem como lições históricas para o povo e os governantes chineses, que enfrentam um grande desafio: como aproveitar os benefícios da globalização sem se tornar dependente dos grandes capitais monopolistas?


1 Professor doutor do IFCS/UFRJ. O autor foi orientado pelo professor Theotônio dos Santos no seu mestrado em Economia da Universidade Federal Fluminense, de 1995 a 1998, durante o período, trabalhou para o Grupo de Estudos sobre a Economia Mundial, a Integração Regional e o Mercado de Trabalho (GREMIMT), coordenado por Theotônio.

2 Toda a tradução foi coordenada por Bai Fengsen, pesquisador superior do Instituto de Estudos Latino-americanos. A primeira parte do livro foi traduzida por Xu Wenyuan, ex-diretor do Departamento de Estudos das Economias Latino-americanas; a Segunda parte, por Su Zhengxing, ex- diretor do Instituto; a terceira, por Wu Guoping, atual diretor do Instituto e a parte final, por Bai Fengsen. Durante a tradução, eles receberam a ajuda do assessor peruano Sr. Juan Murilo.

3 Por questões técnicas, a editora deixou de publicar 3 artigos do livro original, Los Retos de la Globalización, Ensayos en Homenaje a Theotônio dos Santos. Os 3 excluídos são: Enrique Dussel, “El programa científico de investigación de Karl Marx”; Estella Bohadana e René Armando Dreifuss, “La construcción del conocimiento en la era de la información”; Angel G. Quintero Rivera, “Salsa de la gran fuga: la democracia y las músicas mulatas.

4 Globalização e Sistema Mundial, Ensaios em Comemoração dos 60 Anos de Theotonio dos Santos, é um dos 5 livros da série “traduções da globalização”, organizada pela Social Sciences Documentation Publishing House. Os outros 4 livros da mesma série são: Global Transformations: politics, economy and culture, de David Held et al.; Globalization and Ethical Reconstruction, de Helmut Schmidt; Global Sociology, de Robin Cohen e Paul Kennedy; Globalization In Question, de Paul Hest e Graham Thompson.

5 Theotônio dos Santos, A Teoria da Dependência: Balanço e Perspectivas. Rio, Civilização Brasileira, 2000.

6 Esse livro foi publicado em português pela Editora Vozes, em 1993. Em 1999, a mesma editora publicou uma 4a. edição atualizada.

7 Imperialismo y Dependência foi publicado em 1978 (1a edição) no México pela Ediciones Era S.A., e a versão chinesa era baseada na edição de 1986 (4a edição). Nota do autor deste artigo.

8Yuan Xing-cang, “Prefácio à Edição Chinesa do Imperialismo y Dependêcnia, Beijing, Social Sciences Publishing House, 1992.


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