segunda-feira, 12 de julho de 2010

Ezequiel

A morte de Ezequiel comoveu um grande numero de artistas, sobretudo músicos, mais especificamente aqueles ligados ao Rock.

Como velho amigo de Ezequiel desde os tempos da Geração Complemento, quero deixar meu testemunho sobre a sua qualidade humana.


EZEQUIEL NEVES (1935-2010)


Ouvi a noticia no táxi. ”Aumente o som, por favor! É o Ezequiel. Não pode ser.”

Eu nem sabia que ele estava tão mal. É verdade que não pôde ir à nossa reunião da Geração Complemento por sua dificuldade de deslocar-se, segundo explicou o Silviano. “Ademais, ele não escuta bem e não sabe ficar de fora da conversa. Não dá para ele participar de um encontro como este.”

Ora, nos anos 50, Ezequiel trabalhava numa biblioteca quando freqüentávamos o bar Tiroleza e bebíamos a pior bebida que podia existir: conhaque (vagabundo) com Coca-Cola. Nós chamávamos esta droga de “Mosca”. Nunca soube por quê? Talvez por seu sabor horrível e sua aparência asquerosa. Mas a Geração Complemento era assim. Por isto Ezequiel a expressa tão bem. Este gosto pelo desgosto. Esta permanente excitação diante da vida. Esta intelectualização do cotidiano como constante expectativa. Esta atração pelo NADA. Esta aventura estética sempre aberta.

Sobramos poucos! Silviano, que era o amigo mais próximo de Ezequiel, é a expressão mais sistemática desta aventura. Sua obra literária é um exercício permanente de construção estética. Cada obra conduz a seguinte formando um conjunto a ser refeito permanentemente.

Ezequiel se recusa a este planejamento e talvez por isto os dois se complementavam tão bem. Ezequiel era a constante negação do sentido para sua vida ou sua obra estética. Por isto talvez se entregasse tão profundamente a cada um dos seus trabalhos. Sua OBRA era a sucessão de rupturas e o desprezo permanente por qualquer tentativa de transcender o imediato.

Naqueles anos 50 a Companhia de Teatro Tônia- Celi – Autran passou uma longa estadia em Belo Horizonte. Precisavam de dois quase extras na peça A Viúva Astuciosa de Goldoni. Ele e eu fomos incorporados como os criados dos atores principais. Lembro-me da emoção tão forte de Ezequiel. Numa cena movimentada caiu de verdade. Claro que éramos atores amadores. Contracenar com Paulo Autran, Tônia, Margarida Reys, Osvaldo Loureiro, Claudio, meu Deus! Ser dirigido por Adolfo Celi! Tudo isto justificava nossa emoção, mas Ezequiel a vivia com uma intensidade impressionante. Pensei que ele estava diante de sua vocação definitiva de ator. Na verdade ele continuou alguns anos nesta carreira. Depois deixou. Assim como deixou de escrever seus contos tão interessantes. Sua verdadeira vocação era a vida – multiforme, multicética, multi, multi, multi. Uma vida que é uma obra de arte.

Tudo isto pode se ver nos longos comentários que a imprensa vem publicando de seus amigos e admiradores:

Ezequiel...Ah Sim. Uma vez ele...” Sim ele. Meu querido amigo, apesar dos anos que estivemos longe, sempre estive contigo Ezequiel. Ficam as recordações permanentes de você...

Nenhum comentário:

Busca