quinta-feira, 11 de novembro de 2010

QUESTÕES ESTRATÉGICAS SE PRECIPITAM NAS RELAÇÕES BRASIL/EE.UU.

Desde 1968 vêm se deteriorando as relações dos EE.UU. com os militares latinoamericanos. O aparecimento de um governo de segurança nacional de esquerda no Peru foi o toque de alerta. A iniciativa da direita militar brasileira (os chamados “sargentões”, segundo a elite pró-norteamericana que controlou o golpe de 1964) que se opôs à Frente Ampla, deu o golpe no golpe em 1968 e tentou indicar um presidente por voto interno das forças armadas descobrindo que elas preferiam o general “pró peruano” Albuquerque Lima. Este acontecimento levou ao ridículo impedimento da nomeação do mesmo general sob o pretexto absurdo de que ele só tinha 3 estrelas, o que criaria um problema de hierarquia. Depois tivemos o acordo nuclear com a Alemanha que provocou a ira dos Estados Unidos ( segundo Pastor, encarregado da segurança dos EE.UU. para a América Latina na época: o veto a este acordo tinha por razão principal impedir o acesso a material nuclear para a Alemanha, mas é evidente que buscava também deter o avanço nuclear do Brasil). Também foi muito humilhante a resposta de Kissinger a Golberi quando este tentou incluir a criação de uma forte Armada brasileira no Atlântico Sul dentro dos acordos EE.UU. Brasil. Proposta descartada sumariamente pelo Pentágono.

Mas o choque norte americano com os militares de direita, seus aliados por anos na Argentina para impedir que este país majoritariamente Peronista pudesse ser uma democracia onde esta maioria exercesse o poder, foi brutal na crise das Malvinas. A ação dos militares argentinos contava com o apoio da direita norte americana, no poder com Reagan, a partir dos acordos militares depois da II Guerra Mundial que consagravam o princípio do panamericanismo (Doutrina Monroe). Neste pacto, os paises das Américas se uniriam sempre que estivessem sob uma “ameaça externa”. Naquela época se havia inventado que havia uma ameaça comunista (sobretudo da União Soviética) sobre as Américas. Mas, na prática, os EE.UU. apoiou o governo inglês contra a Argentina, numa guerra desigual e brutal. Desde então a doutrina Monroe foi definitivamente banida da região, afetando radicalmente o pensamento geopolítico da direita latino americana tradicional, particularmente das correntes militares que se alimentavam da submissão estratégica aos interesses hegemônicos dos EE.UU., disfarçados em uma guerra fria contra a “expansão” soviética. Depois do fim da guerra fria, imposto pela liderança política da União Soviética, não se dispõe mais de um substituto ideológico para justificar esta submissão que já se encontrava em crise desde a década de 70. Vejam meu livro Imperialismo y Dependencia, Era, México, 1978.

O fim da guerra fria eliminou, por exemplo, a necessidade da OTAN. Para mantê-la, o Pentágono lançou várias justificativas entre as quais se incluía o direito dos EE.UU. a “ações militares preventivas”, assim como o direito de impor os “direitos humanos” a todos os povos do mundo, e,na atualidade, o direito de suspender todas as garantias constitucionais para impor os princípios “democráticos” segundo a interpretação norte americana. A aceitação dos princípios da guerra fria levou uns 10 anos para converter-se numa “lei natural” das relações internacionais. Os novos princípios estão ainda em tentativa de imposição mas são claramente muito mais confusos e contraditórios. Por outro lado, assim como surgiu contra a guerra fria o Movimento dos Não-Alinhados que unificou a maioria dos países do mundo e terminou minando definitivamente a doutrina da Guerra Fria, hoje, a articulação em torno de uma visão plural e anti-hegemônica é muito mais ampla. Particularmente no inicio do século XXI, quando os centros hegemônicos, particularmente os EE.UU., entram em crise e se expandem as novas potências emergentes ( ver a série de livros coodenados por mim sob o título geral de Hegemonia e Contra Hegemonia, 4 vols., Editora Loyala e PUC-Rio, 2003 a 2005) começam a se impor os princípios de uma “hegemonia compartida”, conforme já indicávamos nesta coleção de textos. E caminhamos mesmo para, num futuro próximo, afirmarmos uma nova civilização planetária, múltipla e plural.

O documento das Forças Armadas brasileiras, colocado pelo seu ministro, une a Estratégia de Segurança com a política externa e com os princípios de uma política econômica voltada para o desenvolvimento sustentável e humano que devem caracterizar a atuação do Brasil pelo menos nos próximos anos, sob crescente apoio da sociedade brasileira. Leiam com cuidado este texto:

07/11/2010

JOBIM AFIRMA QUE BRASIL NÃO ACEITA SOBERANIA 'COMPARTILHADA' DO ATLÂNTICO SUL



Jobim: Brasil não aceita soberania “compartilhada” do Atlântico Sul


4 de Novembro de 2010 – 9h16



Jobim defende soberania da América do Sul e critica Otan e EUA



do Vermelho



O ministro da Defesa, Nelson Jobim, criticou veementemente as estratégias militares globais dos EUA e da Otan — aliança militar ocidental. Ele afirmou que nem o Brasil nem a América do Sul podem aceitar que “se arvorem” o direito de intervir em “qualquer teatro de operação” sob “os mais variados pretextos”.



Jobim disse que o Brasil não aceita discutir assuntos relativos à soberania do Atlântico enquanto os norte-americanos não aderirem à convenção da ONU sobre o direito do mar, que estabelece regras para exploração de recursos em águas nacionais.



Ele lembrou que os EUA não firmaram a Convenção sobre o Direito do Mar da ONU e, portanto, “não reconhecem o status jurídico de países como o Brasil, que tem 350 milhas de sua plataforma continental sob sua soberania”. “Como poderemos conversar sobre o Atlântico Sul com um país que não reconhece os títulos referidos pela ONU? O Atlântico que se fala lá é o que vai à costa brasileira ou é o que vai até 350 milhas da costa brasileira?”



Também referiu-se a uma “alta autoridade” americana que defendeu “soberanias compartilhadas” no Atlântico. “Não pensamos em nenhum momento em termos de soberanias compartilhadas. Que soberania os Estados Unidos querem compartilhar? Apenas as nossas ou as deles também?”, questionou.



O ministro da Defesa falou na abertura da 7ª Conferência do Forte de Copacabana, promovida pela Fundação Konrad Adenauer, ligada à Democracia Cristã alemã, para criar um “diálogo” entre América do Sul e Europa em segurança.

América do Sul

Ele se disse contrário ainda as alianças militares entre a América do Sul e os Estados Unidos. “Nossa visão é a de que podemos ter relações com os EUA, mas a defesa da América do Sul só quem faz é a América do Sul”. O ministro defendeu que o Brasil não deve se aliar a forças militares que não aceitem o comando de outros exércitos. “Os EUA não participam das forças humanitárias da ONU porque não admitem ser comandados por outros exércitos. Não podemos aceitar esse tipo de assimetria”, declarou.



Papel dominante



Em resposta ao alemão Klaus Naumann, ex-diretor do Comitê Militar da Otan, que disse que a Europa é o “parceiro preferencial” de que os EUA necessitam para manter seu papel dominante no mundo, o ministro disse: “Não seremos parceiros dos EUA para que eles mantenham seu papel no mundo”.



Segundo Jobim, a Europa “não se libertará” de sua dependência dos EUA e por isso tende a sofrer baixa em seu perfil geopolítico. O da América do Sul tenderia a crescer, pelo crescimento econômico e os recursos naturais, água inclusive, de que dispõe em abundância, enquanto escasseiam no mundo.



Energia Nuclear



Na avaliação de Jobim, as relações entre os países signatários do Tratado Sobre a Não-Proliferação de Armas Nucleares também é assimétrica e penaliza aqueles que buscam gerar energia nuclear para fins pacíficos. Para ele, não há problemas no interesse da Venezuela em dominar essa tecnologia. “A Venezuela sentiu o problema da sua base de energia elétrica ser hidrelétrica e teve inclusive que fazer racionamento”, disse. “A Venezuela fez tal qual o Brasil. E nós aplaudimos”, complementou sobre o país vizinho, considerado um problema no continente pelos EUA.



Cuba



As críticas de Jobim aos norte-americanos ainda abordaram a relação do país com Cuba. “Qual foi o resultado do bloqueio a Cuba? Produziram um país orgulhoso, pobre e com ódio dos EUA”, disse.



Para o ministro, os riscos à segurança da América do Sul e os conflitos do futuro estarão relacionados à água, minerais e alimentos. “Isso a América do Sul tem. Temos aqui o aquífero Guarani, a Amazônia, somos os maiores produtores de grãos e de proteína animal do mundo”, enumerou. “Temos que nos preparar para isso”, advertiu sobre possíveis ameaças futuras.



As declarações do ministro Jobim ratificam no terreno da defesa, os traços determinantes da política externa brasileira. O Brasil optou pelo caminho do exercício da sua soberania, da integração regional e do anti-hegemonismo estadunidense. O pronunciamento reveste-se de grande atualidade, porquanto a Otan, pacto militar agressivo sob a hegemonia norte-americana se reunirá ainda este mês em Lisboa, para definir o novo conceito estratégico. Entre outros pontos, na pauta da cúpula da Otan estão a expansão do raio de ação, com foco para todas as regiões do mundo, incluindo o Atlântico Sul.



Íntegra do discurso no arquivo anexo:

www.defesanet.com.br/forte/vii_jobim.htm (copie e jogue no navegador)

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